Leite com baixa emissão de carbono à irrigação com inteligência artificial: startups de tecnologia impulsionando a revolução verde na América Latina

Com os países da região entre os mais vulneráveis à crise climática, empreendedores digitais têm se inspirado a encontrar maneiras inovadoras de criar mudanças ambientais reais.

Com os países da região entre os mais vulneráveis à crise climática, empreendedores digitais têm se inspirado a encontrar maneiras inovadoras de criar mudanças ambientais reais.

A paixão de Leo Prieto pela natureza começou na infância, à beira-mar. “Eu era obcecado pelo que estava sob a superfície. Eu me ancorava a uma pedra com meu snorkel e era fascinado por todos os pequenos animais fazendo coisas que passam despercebidas.”

Sua adolescência coincidiu com a chegada da internet no Chile, onde ele se tornou um pioneiro da web, lançando e vendendo várias startups. Inevitavelmente, seus interesses pelo meio ambiente, a internet e os negócios se fundiram, movidos pela sensação de que os avanços tecnológicos não deveriam ser desperdiçados.

“Estamos vivendo em um momento em que a ciência e a tecnologia nos permitem fazer quase qualquer coisa, e estamos gastando toda essa energia, todos esses recursos, ajudando as pessoas a colocar orelhas de gato em uma foto. Sério?!” diz o empreendedor.

“Por que não usamos todos esses avanços para resolver problemas reais? Temos problemas reais e temos ferramentas reais – vamos combinar os dois.”

Prieto é um dos muitos empreendedores na América Latina e no Caribe que estão abraçando a revolução verde e estabelecendo negócios e iniciativas sem fins lucrativos focados na conservação, na economia verde e na justiça climática. Muitos deles sentem que a comunidade internacional e os líderes mundiais estão falhando em financiar projetos climáticos de forma suficiente.

Leo Prieto, um empreendedor cuja startup, Lemu, conecta investidores a projetos ambientais. Fotografia: Matias Riveros/Lemu

A mudança está se tornando cada vez mais urgente, já que os 33 países da região estão entre os mais vulneráveis aos impactos da crise climática, tanto econômica quanto fisicamente.

A inovação ambiental é um setor com um potencial significativo de crescimento para a América Latina e o Caribe, afirmam os especialistas. De acordo com um relatório recente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o valor agregado pela economia verde – energia renovável, tecnologias ambientais e bioeconomia – está crescendo. Um dos maiores desafios é o financiamento, e uma grande parte dos projetos visa impulsionar o setor ao conectar investidores a projetos ambiental e socialmente responsáveis.

O sagui-de-cabeça-de-algodão da Colômbia, um dos primatas mais raros do mundo. Uma iniciativa para proteger o macaco criticamente ameaçado é um dos projetos promovidos pela Lemu. Fotografia: Carolina Holguin/Lemu

No Chile, a startup de Prieto, Lemu, utiliza inteligência artificial (IA) e tecnologia de aprendizado de máquina para criar um mercado onde investidores potenciais podem encontrar esquemas relacionados ao clima, biodiversidade, água e desenvolvimento humano que precisam de capital.

Lemu – uma palavra Mapuche que significa floresta – verifica cada projeto para garantir que tenha resultados verificáveis antes de incluí-lo na lista. Os usuários podem ler sobre os projetos, pesquisar por país ou espécies sendo protegidas, navegar por mapas e modelos 3D, e monitorar o progresso por meio de fotos e postagens.

Entre os projetos estão uma iniciativa para proteger os saguis-de-cabeça-de-algodão, um pequeno macaco criticamente ameaçado na Colômbia ameaçado pelo desmatamento e pelo comércio ilegal de vida selvagem, e rinocerontes sendo protegidos dos caçadores furtivos na Reserva de Caça Sibuya na África do Sul.

O aplicativo oferece a opção de fazer doações mensais ou únicas e fornece atualizações e relatórios de impacto. Os projetos destacados recebem 80% de cada doação – a Lemu retém 19% para cobrir seus custos e crescimento, e o restante vai para a 1% for the Planet, que compromete as empresas membros a doar pelo menos 1% das vendas anuais para organizações ambientais.

“A agricultura é responsável por 75-85% do uso da água na América Latina. Então, se você quer trabalhar com [segurança] hídrica, você tem que trabalhar com agricultura.”

Jairo Trad, Kilimo

No Brasil, algumas das startups mais promissoras estão surgindo nos setores de cultivo e pecuária. A Krilltech, que se originou nos laboratórios da Universidade de Brasília, desenvolveu uma nanoestrutura orgânica chamada Arbolina, que, segundo a empresa, melhora a absorção de nutrientes essenciais e estimula o crescimento das plantas, oferecendo uma alternativa não tóxica aos fertilizantes.

Diego Stone, chefe da empresa, relata que os testes do produto mostraram um aumento de 20% na produtividade da soja, um aumento de 12% no trigo e até 40% no crescimento dos tomates. A empresa afirma que sua tecnologia reduz os custos e os resíduos agroquímicos, enquanto aumenta a resistência à seca e outros extremos ambientais.

Membros da equipe da Lemu. O próximo passo para o setor é adotar formas mais confiáveis de verificar os resultados dos projetos, diz o fundador. Fotografia: Matias Riveros/Lemu

Outro desafio para o Brasil é reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. O país é o sexto maior emissor do mundo, com quase 30% das emissões atribuídas à agricultura. A NoCarbon Milk é uma empresa que busca desenvolver métodos mais sustentáveis para a pecuária leiteira.

As emissões de metano são resultado da fermentação dos alimentos nos intestinos do gado, um processo que libera hidrogênio e dióxido de carbono, os quais são combinados por uma enzima para produzir metano. Para combater isso, a empresa utiliza um suplemento alimentar que suprime a enzima, o que, segundo ela, reduz as emissões em até 40%.

Na Argentina, a Kilimo, uma empresa fundada em 2014, está enfrentando a escassez de água ao fornecer aos agricultores ferramentas baseadas em dados para otimizar a irrigação e gerenciar melhor a água. Utilizando IA, o software da empresa combina dados meteorológicos e de satélites para tornar a irrigação mais eficaz, o que, segundo eles, pode ajudar os agricultores a reduzir o uso de água em até 20%.

Seu cofundador, Jairo Trad, diz que agricultores da Argentina, Brasil, Chile, Guatemala, México, Peru e Uruguai utilizam o software, que economizou 72 milhões de metros cúbicos (19 bilhões de galões americanos) de água nos últimos dois anos. Como neto de um pequeno proprietário de terras na província de Córdoba, na Argentina, que enfrentou sucessivas secas, Trad testemunhou a escassez de água de perto.

“A agricultura é responsável por 75% a 85% do uso total de água na América Latina. Então, se você quer trabalhar com [segurança] hídrica, você tem que trabalhar com agricultura”, afirma.

O software da Kilimo combina dados meteorológicos e de satélites para produzir recomendações de irrigação, o que pode ajudar os agricultores a reduzir o uso de água em até 20%. Fotografia: Cortesia da Kilimo

Outra empresa argentina, Nativas, foi fundada em 2022 para direcionar fundos para projetos de regeneração de ecossistemas. A startup incentiva os agricultores a integrar árvores nativas em suas plantações e criar corredores biológicos para a vida selvagem.

Ela utiliza tecnologia blockchain para verificar os benefícios dos esquemas de regeneração e conectá-los com empresas interessadas em investir. “Estamos demonstrando que atividades para implementar a [regeneração de ecossistemas] podem ser remuneradas”, diz o cofundador, Gaspar Mac.

Ainda é um início para a startup, que tem projetos piloto em diferentes partes da Argentina, incluindo o Gran Chaco, um bioma sob estresse significativo que abrange o norte da Argentina, Paraguai e Bolívia. Dois dos projetos se concentram na agricultura regenerativa, um na conservação da biodiversidade e outro na conscientização das empresas sobre os benefícios socioambientais da restauração de áreas úmidas. “Nosso objetivo é curar a terra”, diz Mac.

Em Honduras, um projeto de economia circular sem fins lucrativos também está ganhando espaço. A Sustenta Honduras é uma organização jovem focada em maneiras inovadoras de promover o “empoderamento climático”.

“Em 2019, li que Honduras havia se tornado o país mais vulnerável aos efeitos das mudanças climáticas no mundo. Foi quando a ideia e a necessidade da Sustenta nasceram”, diz Ricardo Pineda, presidente e cofundador da iniciativa.

A organização está trabalhando em dois projetos principais. O primeiro transforma gorduras animais residuais em sabonete ecológico para pets. No segundo, jovens voluntários coletam óleo de cozinha usado de residências e o transformam em sabonete. “O uso doméstico de óleos de cozinha é muito alto em Honduras, e o desperdício muitas vezes acaba em rios ou é descartado em florestas. Estamos procurando novas maneiras de criar um ciclo para esses produtos.”

Outro projeto, um recente vencedor do prêmio Youth4Climate Challenge, utiliza dados para fornecer eletricidade renovável para 45% de todas as escolas sem energia em Honduras. “Usamos big data para encontrar caminhos econômicos para eletrificar comunidades remotas por meio de escolas sem acesso à eletricidade”, diz Pineda. “Isso permite que comunidades e organizações determinem se é melhor instalar uma micro-rede independente ou estender a distribuição da rede principal, dado o potencial de energia renovável de mais de 7.000 escolas que atualmente não têm acesso à eletricidade.”

Prieto afirma que o próximo passo para garantir um salto de qualidade em projetos de pesquisa ambiental na América Latina e no Caribe seria adotar formas mais confiáveis de verificar os resultados. “Temos todos esses projetos realizando todas essas ações diferentes, e não sabemos se eles funcionam. Isso é dramático”, diz ele. “Precisamos de métricas quantificáveis, rastreáveis e auditáveis por trás do que está acontecendo para ter um impacto duradouro.”

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